1 de março de 2010

TOMBAMENTO E PARTICIPAÇÃO POPULAR (ESCLARECENDO DÚVIDAS)


Encaminho, por meio do blog do Mover, o conteúdo da publicação Tombamento e Participação Popular, do Departamento do Patrimônio Histórico, que muito nos auxiliará na compreensão de temas vinculados à questão do tombamento.


TOMBAMENTO E PARTICIPAÇÃO POPULAR

Créditos:
Prefeitura do Município de São Paulo
Secretaria Municipal de Cultura
Departamento do Patrimônio Histórico
CONPRESP - Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (segunda edição)

APRESENTAÇÃO

Esta nova edição de TOMBAMENTO E PARTICIPAÇÃO POPULAR pretende dar continuidade às discussões que envolvem a proteção legal dos bens culturais paulistanos.
Neste sentido, optamos por manter os textos da primeira edição, tanto a apresentação, quanto o formato e conteúdo das perguntas e respostas, pois entendemos que são ainda válidas para o debate que envolve a questão da proteção do patrimônio histórico e cultural de São Paulo. Mais do que uma edição atualizada, esta publicação TOMBAMENTO E PARTICIPAÇÃO POPULAR II pretende aprofundar questões complementares àquelas presentes em sua primeira versão.
Em sua edição original TOMBAMENTO E PARTICIPAÇÃO POPULAR, contém o histórico dos processos, problemas e embates enfrentados pelos órgãos públicos que têm sob sua responsabilidade a preservação dos testemunhos físicos de nossa memória social.
Publicada em julho de 1991, TOMBAMENTO E PARTICIPAÇÃO POPULAR nos conta um pouco da história do DPH e do CONPRESP. Como é sabido por muitos, o DPH tem suas origens no Departamento de Cultura, idealizado e dirigido por Mário de Andrade nos anos 1930 e, em 1975 quando da criação da Secretaria Municipal de Cultura, foi reformulado e passou a contar com uma estrutura técnica e administrativa, que se mantém até os dias de hoje, composta por quatro divisões, das quais três são técnicas e uma administrativa. A preservação dos documentos históricos produzidos pela administração pública municipal está sob a responsabilidade da Divisão do Arquivo Histórico Municipal. A administração das casas históricas, constitutivas do acervo de exemplares da chamada “arquitetura bandeirista”, bem como a guarda do acervo de bens móveis e dos documentos em suporte fotográfico é levada a cabo pela Divisão de Iconografia e Museus. A salvaguarda do patrimônio construído de importância histórica e cultural, constituído pelos elementos tangíveis que configuram a cidade, é competência da Divisão de Preservação.
O CONPRESP, o órgão de assessoramento cultural integrante da estrutura da Secretaria Municipal de Cultura que tem por principal atribuição deliberar sobre pedidos de tombamento de bens culturais, foi criado pela lei municipal aprovada em 1985, mas teve a sua primeira convocação somente no final do ano de 1988. Foi a partir da década de 1990 que o CONPRESP passou a ser conhecido pela população, já que desde então, atuou de forma mais intensa e polêmica.
O tombamento é um mecanismo legal que visa a proteção de bens culturais. Ratificado pelo conhecido Estatuto da Cidade, recentemente aprovado pelo Congresso Nacional, a utilização desse instrumento instiga intensos debates devido a sua eficácia para a preservação física dos bens imóveis que constituem o acervo construído nas cidades.
Dentre o conjunto de bens culturais, o tombamento de edifícios, conjuntos arquitetônicos e bairros inteiros, que em São Paulo são iniciativas da população organizada, é sempre assunto polêmico. O tombamento ora é tratado como um mecanismo de “congelamento” da cidade sendo, portanto, visto como um empecilho para a sua “modernização”, ora é utilizado por grupos sociais como um dos instrumentos que pode garantir qualidade de vida numa cidade que gradativamente tem sido descaracterizada e deteriorada pelas desordenadas
transformações urbanas.
Para que se possa proporcionar um debate mais amplo e democrático sobre essa questão é necessário, antes de mais nada, esclarecer como se dá o processo de tombamento de um bem cultural, bem como entender quais são seus efeitos sobre a cidade. O tombamento, mais do que preservar bens e objetos antigos, deve possibilitar a melhoria da qualidade de vida das pessoas e como tal, preservar os suportes da memória social fortalecendo o sentimento de pertencimento e cidadania.
O objetivo desta publicação, a qual denominamos “cartilha”, é o de continuar possibilitando à população um conhecimento e um entendimento, mesmo que preliminares mas consistentes, sobre o que é o tombamento. Entendemos a cidade como um território de conflitos onde quotidianamente todos lutam pelos seus interesses, mas as batalhas somente poderão ser enfrentadas na medida em que todos souberem quais são as regras que disciplinam a cidade. Assim, TOMBAMENTO E PARTICIPAÇÃO POPULAR II, propõe instrumentalizar e informar a todos como o tombamento pode assegurar a preservação dos elementos que nos propiciem resgatar a memória social e a qualidade de nossas vidas em uma cidade como São Paulo.
Leila Regina Diêgoli
Departamento do Patrimônio Histórico
São Paulo, 2001.

Tombamento: O que você precisa saber e entender : ALGUMAS PERGUNTAS

1. O que é tombamento?
O tombamento significa um conjunto de ações realizadas pelo poder público com o objetivo de preservar, através da aplicação de legislação específica, bens culturais de valor histórico, cultural, arquitetônico, ambiental e também de valor afetivo para a população, impedindo que venham ser demolidos, destruídos ou mutilados. O tombamento municipal é regido pela Lei n0 10.032 de 27 de dezembro de 1985 e Lei n0 10.236 de 16 de dezembro de 1986.

2. O que pode ser tombado?
O tombamento pode ser aplicado a bens móveis e imóveis, quais sejam: acervos
arquivísticos, livros, mobiliários, utensílios, obras de arte, edifícios, ruas, praças e bairros, ou seja, em qualquer artefato produzido pelos homens, desde um papel até uma cidade. Atualmente, também estão sendo considerados passíveis de tombamento os chamados bens intangíveis, a exemplo de festas e cultos.

3. O ato do tombamento é igual à desapropriação de um imóvel?
Não. São atos totalmente distintos. O tombamento não altera a propriedade de um bem; apenas proíbe que venha a ser demolido ou mutilado.

4. Um bem tombado pode ser alugado ou vendido?
Sim. Desde que o bem tombado continue sendo preservado, não existe qualquer
impedimento para sua venda ou aluguel.

5. O tombamento preserva?
Sim. O tombamento é a primeira medida a ser tomada para a preservação dos bens
culturais, na medida que impede juridicamente a sua destruição. Esta é uma questão polêmica, pois a preservação somente torna-se visível para todos quando um bem cultural encontra-se em bom estado de conservação, propiciando sua plena utilização.

6. O tombamento de edifícios ou bairros inteiros “congela” a cidade, impedindo suamodernização?
Não. A proteção do patrimônio ambiental urbano está diretamente vinculada à melhoria da qualidade de vida da população, pois a preservação da memória é uma demanda social tão importante quanto qualquer outra atendida pelo serviço público. O tombamento não tem por objetivo “engessar” ou “congelar” a cidade: esse termo, aliás, é um instrumento de pressão, largamente utilizado para contrapor interesses individuais ao dever que o poder público tem em direcionar as transformações urbanas necessárias. Tombar não significa cristalizar ou perpetuar edifícios ou áreas urbanas, inviabilizando qualquer obra que venha contribuir para a melhoria da cidade. Preservação e renovação são ações que se complementam e, juntas, podem revalorizar imóveis ou bairros que se encontram deteriorados.

7. O tombamento é um ato autoritário?
Não. Em primeiro lugar o tombamento, como qualquer outra lei, estabelece limites aos direitos individuais, com o objetivo de resguardar e garantir direitos e interesses comuns do conjunto da sociedade. A definição de critérios para intervenções físicas em bens culturais tombados objetiva assegurar sua integridade, considerando-se o interesse da coletividade. Não é autoritário porque sua aplicação é avaliada e deliberada por um conselho de representantes da sociedade civil e de órgãos públicos, com poderes estabelecidos pelo Legislativo Municipal.

8. Qual é o órgão responsável pela preservação dos bens culturais paulistanos?
No âmbito municipal é o CONPRESP (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo), que tem por atribuição deliberar sobre os pedidos de tombamentos de bens culturais. Também o DPH (Departamento do Patrimônio Histórico) tem essa atribuição na medida em que, além de ser o órgão técnico de apoio do CONPRESP, tem sob a sua responsabilidade a salvaguarda de diversos acervos, como edifícios, documentos, fotografias, mobiliário, obras de arte, etc.

9. Por que um edifício é tombado tanto pelo CONPRESP quanto pelo CONDEPHAAT?
De acordo com a Constituição Brasileira cabe concorrentemente às três esferas do governo a proteção dos bens culturais. Assim de acordo com a importância e representatividade de um bem, este pode ser tombado no âmbito federal pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), no estadual pelo CONDEPHAAT (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo) e no municipal pelo CONPRESP. Assim, um edifício pode ser tombado pelo IPHAN e “ex-officio”
pelo CONDEPHAAT e pelo CONPRESP, o mesmo ocorrendo com os bens tombados somente pelo CONDEPHAAT poderão ser tombados “ex-officio” pelo CONPRESP. Já o inverso, ou seja um bem tombado pelo CONPRESP, não precisa ser, obrigatoriamente, tombado pelo CONDEPHAAT ou IPHAN; tudo dependerá de seu valor e importância. Tombamento “ex-officio” significa que obrigatoriamente o bem deve ser protegido independente das opiniões e decisões dos conselhos estaduais e municipais.

10. É possível a qualquer cidadão pedir o tombamento de um bem cultural?
Sim. Qualquer pessoa física ou jurídica pode pedir a preservação de bens culturais localizados no Município de São Paulo. O pedido é feito por meio de correspondência endereçada à Presidência do CONPRESP e deverá conter as seguintes informações:
- Endereço e localização do bem;
- Justificativa do pedido esclarecendo a importância da preservação do bem;
- Nome e endereço do interessado;
Caso seja possível o interessado deverá indicar nome e endereço do proprietário e fornecer documentação sobre o bem, tais como dados históricos, desenhos e fotografias. Esse material facilitará a análise do pedido agilizando a avaliação e deliberação do CONPRESP.

11. O que é um processo de tombamento?
O tombamento é uma ação que se inicia com o pedido de abertura de processo de tombamento, por iniciativa de qualquer cidadão, do DPH e de qualquer membro do CONPRESP. Este pedido, dependo das informações disponíveis sobre o bem, poderá ou não ser preliminarmente instruído pelo DPH. Após instrução preliminar, o pedido é submetido à deliberação do CONPRESP. Se o conselho considerar o bem cultural importante, expedirá uma resolução de abertura de processo de tombamento. Nesta situação são proibidas as demolições e as reformas sem prévia autorização do CONPRESP e do DPH.
Caso o CONPRESP delibere que o bem não apresenta interesse, o pedido de abertura de processo de tombamento será arquivado. Após a publicação da resolução de abertura de processo de tombamento, são realizados estudos mais aprofundados sobre o bem para, então, o CONPRESP emitir a deliberação final pelo tombamento ou arquivamento do processo.

12. Qualquer pessoa pode opinar sobre um processo de tombamento?
Sim. O interessado deverá encaminhar seu parecer através de correspondência para a Presidência do CONPRESP. Todos os documentos e pareceres serão anexados ao processo administrativo de tombamento para análise tanto do DPH como do CONPRESP.

13. Existem prazos determinados para a deliberação final de um processo de tombamento?
Não. Por tratar-se de uma decisão importante e criteriosa, muitos estudos devem ser realizados para a instrução do processo e, conforme sua complexidade, cada caso demandará prazos diferenciados.

14. Por que muitos edifícios tombados podem ser totalmente reformados internamente?
Porque na decisão final de tombamento são estabelecidos os níveis de preservação dos bens. De acordo com a importância, estado de conservação e grau de alteração de um edifício na resolução final pode estar indicado que o imóvel deve ser preservado integralmente, ou seja, interna e externamente, bem como parcialmente, como por exemplo devem ser preservadas as fachadas e cobertura. Existem casos que a importância do edifício está apenas em sua volumetria, qual seja implantação e gabarito de altura. Por exemplo no caso do tombamento dos bairros projetados pela Cia. City (como o Pacaembú), o tombamento foi aplicado nas áreas verdes e permeáveis, na vegetação de porte arbóreo e na densidade construída das edificações. Portanto, alguns edifícios podem até ser demolidos, mas a nova construção deverá respeitar o padrão urbanístico estabelecido na resolução de tombamento.

15. O que é a área de proteção de um bem tombado?
Na resolução final de tombamento, o CONPRESP também aprova um perímetro em torno do bem tombado, delimitado para propiciar a proteção de sua a ambiência. No caso do CONPRESP, essa área é definida caso a caso; em alguns casos, pode se limitar ao lote do edifício tombado, e toda e qualquer intervenção que venha a ser feita dentro desse perímetro, como novas construções, reformas, demolições, instalação de anúncios, colocação de mobiliário urbano, dentre outras, deverão ser previamente aprovadas. No caso dos bens tombados pelo CONDEPHAAT a área de proteção é sempre delimitada por um raio de 300 metros.

16. Um imóvel tombado ou em processo de tombamento pode ser reformado?
Sim. Toda e qualquer obra deverá ser previamente analisada pelo DPH e CONPRESP. A aprovação depende do nível de preservação do bem e está sempre vinculada à obrigatoriedade de serem preservadas as características construtivas que levaram-no a ser tombado. O DPH fornece gratuitamente assessoria aos interessados em reformar bens culturais tombados.

17. Um imóvel tombado pode mudar de uso?
Sim. O que será considerada é a adequação entre a preservação das características do edifício e as adaptações necessárias ao novo uso.

18. Como um interessado deve pedir a aprovação de obras em imóvel protegido?
Inicialmente o interessado deve dirigir-se ao CONPRESP ou DPH para saber qual é a proteção legal incidente no imóvel, bem como tomar ciência da resolução do CONPRESP para saber sobre as diretrizes de preservação e a documentação necessária para a análise do projeto e emissão de parecer técnico. Além disso, se o bem for protegido pelo CONDEPHAAT ou pelo IPHAN, também deverá solicitar prévia aprovação de obras nesses órgãos.

19. Caso uma pessoa faça obras em um bem protegido sem prévia autorização, haverá alguma penalidade?
Sim. Além das penalidades previstas na legislação edilícia, o responsável pelo imóvel protegido, seja tombado, em processo de tombamento ou localizado em área de proteção do bem tombado, pode sofrer as sanções previstas na Lei n0 10.032/85, que criou o CONPRESP, além de outras penalidades previstas em outras cartas legais.

20. Qual é o órgão responsável pela aplicação de multas e interdição de obras irregulares?
No caso da Prefeitura do Município de São Paulo a aplicação de multas e interdição de obras é feita através das atuais Administrações Regionais. O DPH realiza, na medida do possível, vistorias em bens protegidos, mas para interceder na execução de obras irregulares deve acionar Administrações Regionais.

21. Qualquer pessoa pode denunciar a existência de obras irregulares em bens protegidos?
Sim. A experiência demonstra que a população tem sido a mais eficiente fiscal da preservação dos bens culturais paulistanos. Quando qualquer pessoa tiver conhecimento da execução de demolições e obras irregulares em bens protegidos deverá comunicar o fato à Administração Regional, ao DPH, ao Ministério Público, bem como à Delegacia de Policia Civil.

22. O custo de uma obra de restauração e conservação é elevado?
Não. O termo restauração é utilizado para denominar qualquer obra executada em edifício histórico, tombado ou não. Na maioria dos casos, o custo de uma obra de conservação ésemelhante a qualquer obra convencional, utilizando-se inclusive a mesma mão-de-obra e materiais construtivos. Obras de conservação e restauração tornam-se onerosas quando o imóvel encontra-se em péssimo estado de conservação. Outra situação é a dos edifícios que contém muitos elementos decorativos e artísticos e técnica construtiva excepcional, o que requer mão-deobra especializada, elevando o custo dos serviços. Contudo, esses exemplares são poucose constituem geralmente edifícios públicos.

23. Existe algum incentivo fiscal para proprietários de bens tombados?
Sim. No âmbito municipal, foi instituída legislação que estabelece isenções do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) para os imóveis que forem restaurados, bem como as chamadas “Operações Urbanas” também dispõem de mecanismo, como a possibilidade de venda do potencial construtivo excedente cujos recursos devem ser destinados à execução de obras de restauro. Além desses mecanismos, existe ainda a chamada Lei Mendonça, de incentivo à projetos culturais no âmbito municipal, e a Lei Rouanet no âmbito federal. O
DPH oferece informações sobre os procedimentos a serem adotados para a obtenção desses incentivos.


CRÉDITOS

Leila Regina Diêgoli
Maria Candelária Volpone de Morais


Revisão
Jaime Rodrigues
Mirna B. Pereira

Edição e Redação
Maria Clementina P. Cunha
Leila Regina Diêgoli
Walter Pires
Olga Brites
José Roberto dos Santos Pinheiro
Vânia Lewkowicz

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